.
.
I
.
Já impávido, o sol surgia, demente
Quando em prantos um jovem penitente
Chorava por seu amor que o torturara
Clamava por sua amada que o deixara
Noite ainda quando sua dama lhe falou
"Traze-me uma rosa vermelha de amor
E meu véu de noiva levantarás, tão logo a traga
Antes porém, não mais terá minha mão tão delicada"
"Chega-me cá com a rosa vermelha e me beije
E com esse beijo somente tua eu vou ser
Porém, venha sem a rosa, e para me deixe"
E o jovem amante chorava amargamente, banhado pelo sol
Pois pensava estar só, só que não podia ver
Que de cima de uma árvore, o ouvia o pequeno rouxinol
II
"Onde acharei tão púrpura rosa
Para o meu poder encantar, tão cheirosa?
Nestas tristes paisagens de neve sem flor
Não há única rosa vermelha de rubor"
"Sem a rosa, meu amor perderei
E sem meu amor nada serei
Oh vida! o que será então minha sina
Deixar de ser amado? Eis o que me atina..."
E amargurado, o jovem amante chorava
E os bichos e as plantas por ele se condoíam
E o pequeno rouxinol dele se apiedava
Por sua amada, o jovem chamava...em vão
De tanto chorar, suas pálpebras lhe doíam
E somente o rouxinol, tão puro, entendia seu coração
.
.
III
.
Disse então o rouxinol, com voz cantante: "Sara-te de tua dor, jovem amante
Que a ti farei feliz com um grande favor
Dar-te-ei a mais vermelha rosa flor"
"Não receies o que o destino lhe traz
Cura-te pois de tuas mágoas, nobre rapaz
Que de teu tão puro amor me apiedei
E por ti a mais vermelha rosa buscarei"
E o rouxinol fez tais promessas
Sem que o jovem o entendesse, chorava somente
E nada ouvia além do canto do rouxinol em festas
Entardecia quando para longe voou o rouxinol
Em busca do remédio para o jovem de puro coração
Deixando jovem amante, tristemente só.
IV
Enfrentando chuva e vento
Voou o rouxinol por muito tempo
Até que ao longe uma planta avistou
"É a roseira vermelha", o viajante pensou
Disse o rouxinol à roseira com seu canto:
"Dá-me uma rosa vermelha de encanto
Que para ti, toda noite cantarei
As mais belas canções que só eu sei"
"De bom grado lhe daria, meu amigo
Se rosas vermelhas tivesse aqui em meu dorso
Mas só rosas em meus ramos eu abrigo"
E o rouxinol seguiu em frente, triste
À procura da singela rosa, já receoso
Pelo jovem amante que deixou em riste
V
Voou por mais longe tempo ainda
Por entre folhas e flores tão lindas
Até que adiante, avistou a brilhar
Uma roseira bela de se apreciar
Disse então com voz tão delicada:
"Dá-me uma bela rosa encarnada
Qeu somente para ti cantarei
As mais belas canções que só eu sei."
"Não só uma te daria, mas milhares
Se cá as tivesse, tão belas são
Mas só rosas amarelas tenho, se bem me olhares"
E para longe foi o rouxinol, voando
Para encontrar rosa tão vermelha quanto seu coração
Pelo jovem rapaz, que chorava triste, mas amando
VI
Mais à frente ou rouxinol pode ver
Uma imensa planta ao vento se debater
Perto foi voar e alegre notou
Que enfim, a roseira vermelha encontrou
Falou então o rouxinol à parelha:
"Se realmente és uma roseira vermelha
Apiede-se de mim, servo do amor que sou
E dá-me tua semelhante rosa, sem temor"
"Se para mim deres tão bela rosa
Dar-te-ei minha palavra singela
Que para ti toda noite cantarei minha prosa"
"Cantarei as mais doces melodias
Que os poetas desejam para inspirar, de tão belas
Se me deres a flor encantada de magias."
VII
Respondeu então a roseira com louvor
"Pequeno rouxinol, enviado do amor
Encanta-me com tua promessa divina
E dar-te-ia tal rosa, se a tivesse, tão linda"
"Sou uma roseira vermelha, não te enganas
Mas minhas rosas morreram todas, profanas
Não aguentando o frio matinal, tão forte era
Não resistindo a fria neve, de tão severa"
"Rosas vermelhas demorarão a nascer
Somente quando todo frio cessar
E o quente verão, estas paisagens reter"
"Porém, quando tal dia estiver por vi, airosa
Tens minha sincera palavra, ei de jurar
Que somente tua será a minha primeira rosa"
VIII
"Oh! Não minha solitária roseira
Preciso da rosa hoje de qualquer maneira
Para que possa conseguir o jovem amante
Presentear sua donzela amada de relance"
"Crie, ainda que díficil, um milagre a mais
Una, neste momento, todas as suas forças vitais
E faça com elas a mais perfeita rosa
E dei-me-a, para pelo amor ser honrosa"
"Não notas meu grande desespero?
Por longe tempo voei, sem parar
Para no fim ter tamanho desterro?"
"Tão fraco estou, que mal posso me sentir
Mas mantenho-me firme, sem descansar
Para somente a rosa vermelha enfim conseguir"
IX
"Meu encantável pássaro amigo
É com grande pesar que vos digo
Que não posso uma rosa conceber
Ou em tão pouco tempo a conceder"
"Há porém, uma maneira para a rosa criar,
Mas ai de ti! Temo somente por pensar
Terás de sacrificar tua vida, sem resistir
Para uma rosa vermelha encarnada conseguir"
"Quando a lua cheia brilhar no alto
Terás de apoiar teu peito em meu espinho mortal
Até que seu coração ele toque de sobressalto"
"Então cantar-me-ás uma bela canção
Até o broto, `inda alvo, seu sangue sugar
E encarnado torna-se, como teu coração"
X
.
"Se essa é a única maneira, a farei
Pois é por amor tudo o que faço, bem o sei
Olhe, é a lua cheia já chegando
Preparar-me-ei para meu último canto"
Sacrificar-se-ia por uma causa nobre
Apesar de sua vida ser o que lhe cobre
Estava disposto a tudo, por amor
E assim o faria, em seu último clamor...
E disse com sua voz encantada:
"Cá estou pronto, a esperar
Para minha vida, a rosa dar"
"Darei todo meu sangue, se o for preciso
Para o broto ainda alvo encarnar
E torná-lo vermelho, então de narciso
XI
.
"Oh, pequeno rouxinol errante
Se-me-á díficil, mas o farei nesse instante
Pois bem sei que tudo é por amor
E somente por ele sofrerás tal dor"
"Agora aproxime deste espinho teu peito
E faça de meus frágeis galhos, teu leito
Comece a cantar agora tua mais bela canção de amar
Continue e não cesses mais de cantar"
E o corajoso rouxinol nada mais via
E mesmo muito fraco, só pensava em cantar
Cantava tanto, que seu corpo já não mais sentia
Sua canção falava de amores abandonados
Aqueles que não são correspondidos no altar
Aqueles que nos deixam só e calados...
XII
.
Cantou tanto o rouxinol, de si mesmo algoz
Até que sem forças, perdeu a voz
E caiu devagarinho ao chão, desmaiado
Vendo apenas um desenho vermelho encarnado
Era a rosa vermelha, a roseira garantiu:
" mais bela rosa vermelha que já existiu"
Brilhava tanto, que parecia um vermelho diamante
E com certeza agradaria o amor do jovem amante
"Olhe bem! Criaste a mais bela rosa que há!
Afinal, caro rouxinol, conseguiste
Isto com certeza a jovem amada agradará"
Mas o pássaro não ouvia mais, já penitente
Não mais sentia nem cantava. Sua feição era triste.
Sua alma, enfim, adormeceu celestialmente
XIII
.
E a roseira percebendo que o rouxinol cantante
Já mais vivia para alegrar a floresta dançante
Por ele chorou amargamente, sem sparar
Enquanto os outros animais o adoravam, como em um altar
Enfim, a roseira pediu ao pardal veloz
Que levasse sem demora a rosa algoz
À janela do jovem amante, rapidamente
para que ele a ofertasse à sua amada, de presente
E quando o jovem amante acordou
Viu em sua janela uma bela rosa
De tão linda que era, ele mal acreditou
E sem demora ele a tomou em seus braços
E dirigiu-se à casa de sua amante deleitosa
Para com a rosa reaver seu amor em pedaços
XIV
Porém, a jovem amante ao pegar a rosa
Disse: "Não mai quero essa flor horrorosa
Pois conheci ainda ontem um príncipe, que por mim se apaixonou
E é para ele que eu darei minha mão e todo meu amor
"Acaso uma ros tão feia e seca como couro
É capaz de comparar-se ao brilho do ouro?
Anda! Sai de minha casa, que ocupada estou
E com meu rico príncipe me encontrar eu vou!"
O jovem, de coração partido, foi e adoeceu
Jogada ao chão, ficou a negra rosa
E arrependido de sua vida, o jovem morreu
-Tanto amou o jovem, tanto sofreu o rouxinol
Para no final de toda essa triste saga
vossas vidas serem trocadas por vil metal-"
(e na floresta, todos animais e planta ainda choram de saudades pelo pássaro apaixonado...)
Grecco Moralles